-Lizzie, soube que seus pais tem uma pousada aqui perto. -Ah, viajante , claro!
-Por favor, me chame de Liz. Sim, temos sim, conhece?
-Como quiser. Não conheço, ainda.
-É viajante?
-Hã?
-Passa aqui de vez em quando, ou pretende parar em uma pousada? -Ele fez cara de desentendido, talvez não estivesse mesmo entendendo.
-Não Liz, eu moro aqui, ou melhor, irei morar. -Então ele sorriu e dessa vez quem ficou inebriada foi eu. Dentes perfeitos, brancos feito neve, um contraste tão perfeito e tão harmônico com seu cabelo que me deixava vidrada. Sua boca era carnuda e rosada, dava pra ver daqui a maciez que aparentava. Parei bem no meio desse pensamento. Onde estava "os meninos não se aproximavam" e os "eu estou bem obrigada"? Eu me sentia febril. Suspirei e respondi.
-Ah sim. Nunca te vi mesmo. -Tentei me fazer de indiferente, mas estava disfarçando tão mal que nem eu acreditei.
-Claro que não. Porque você não ta com o pessoal da sua escola?
-Não, estou bem aqui.
-Perguntei o porque Liz, percebi que você está bem aqui. -Agora me ofendeu. O olhei inexpressiva enquanto esperava a raiva se dissolver.
-Sinceramente, de que isso te importa? -Bufei. E ele não sabia o que responder, respondeu meu olhar com um muito mais intenso, eu nunca chegaria aos pés daqueles olhos, e rspidamente toda a raiva passou por mim como se nunca estivesse ali.
-Vamos com calma então. Vai me contar o porque? -Ele perguntou ainda prendendo o meu olhar, e eu não consegui deixá-lo. Forte demais, intenso demais. Eu não era párea para esse tipo de hipnotização.
-Só não ando, -respondi mais calma- eles não parecem gostar de mim. De onde você os conhece?
-Meu primo estuda na CEFET, ele provavelmente é da sua sala. E eu passei pelo concurso, então... -Ele respondeu, aproveitando para se vangloriar. Comecei a achá-lo metido.
-Ah. -Resposta automática.
-Então Liz, porque não vai comigo pra lá com eles?
-Não quero, muito obrigada.
-Vamos, eles são legais. -Ele insistiu. Tadinho, eu não queria magoá-lo dessa forma, mas tive que fazê-lo.
-Pra mim não. -Eu ri dessa. Ele continuou me olhando como se não entendesse porque para mim eles não eram legais.
-É, eles disseram que você era do tipo excluída. -Ele zombou.
-Vai continuar a me ofender ou vai logo me dizer o que quer? -Curta e grossa, quem ele acha que ele é pra chegar aqui e falar esse tipo de coisa?
-Desculpe se a encomodo. -Ele se levantou e eu me levantei junto. Ele pareceu sincero, como se realmente importasse se ele me encomodava. Ia virando as costas quando eu não aguentei mais.
-Bernardo? -Ele se virou para me olhar. Seco, e não como antes.
-Que foi?
-Desculpe-me. Eu não gosto de certas brincadeiras. Pode relevar isso? -Achei ter visto um faiscar de alegria em seus olhos. Ele apenas assentiu. Tentei ser mais simpática.
-Então, me diz, qual o seu sobrenome, hum? -Ele pareceu se surpreender por eu ter notado que ele não tinha se apresentado com o nome todo.
-Meu sobrenome é Hokki.
-Hum... interessante. Sabes o meu? -Pergunta tosca, nada melhor pra começar um assunto.
-Acho que sim. -Ele riu, e eu gostei, estava funcionando. Mac-Culloch não é?
-Sim ! -Eu sorri e ele retribuiu.
Eu estava gostando da nossa conversa, ele me perguntou muita coisa. Não era bem uma conversa, até porque eu mal perguntei, ele é que estava me questionando e eu não via motivos para não responder. Ele começou com perguntas inofensivas, como a minha cor preferida ou talvez o tipo de bijouteria que eu mais gostava, e eu respondia prontamente o satisfazendo. Ele continuava simpático e Vi não aparecia, percebi então que ela estava com o mesmo menino alto e loiro que dançara com ela a uma hora atrás, e para variar, estavam em um assunto muito mais interessante. Eu ri e ele me perguntou do porque do meu riso, então ele percebeu minha amiga. Ele disse algo como "é, ele é o pegador da cidade, meu primo" , mas senti que ele não disse isso de forma que dava glória a ele por ser o que ele acabara de caracterizar e sim de forma brusca e até com uma pontada de arrependimento por ter percebido e reparado no menino que diz ser seu primo. Eu rapidamente mudei o assunto vendo que não era sobre isso que ele queria falar, então perguntei mais coisas sobre ele, e ele respondeu com a mesma animação de antes continuando a me perguntar. Uma ou duas vezes ele parou para falar com alguém que passava, e logo depois continuava com suas perguntas que se tornavam mais invasivas como seu olhar, e eu não tinha percebido que a festa já estava esvaziando até que eu bocejei e o sono queria me pegar de jeito. Ele rapidamente notou isso. Ele não parecia com sono, até que eu realmente olhei sua expressão que por um acaso mudou no exato momento que o sono estava começando a se formar em mim. Procurei minha amiga, ela não estava a vista. Me desesperei.
-Cadê a Vi?
-Cadê quem? -Ele logo notou minha transformação de humor.
-A Vi, a menina que tava com seu primo.
-Ah, sua amiga foi pra casa com o Gustavo, não viu?
-Sério? Não vi. -Me senti envergonhada por isso.
-Me avise quando mudar de humor assim tão rápido. -Eu ri disso.
-Claro que sim. Como se eu soubesse quando eu vou ficar preocupada com uma amiga. -Ele sorriu, o sorriso criando covinhas perfeitas em uma só de suas bochechas.
-Claro que você vai saber.
-Bem, eu acho que eu tenho que ir. -E fui me levantando.
-Agora? -Ele parecia frustrado.
-Sim.
-Bem, eu te levo então, eu to de carro...
-Eu também. Fica tranquilo, eu vou dirigindo.
-Posso te fazer uma pergunta?
-Uhum.
-Vai amanhã para o colégio?
-Sim, segunda né?
-Uhum.
-Então, Bernardo Hokki, foi um prazer te conhecer, até amanhã!
-Tudo bem, Lizzie Mac-Culloch, foi todo o meu, com toda certeza. Até .
Dei dois beijinhos nele costumeiros e fui direto para meu celtinha quente e familiar. Parecia que eu tinha acabado de sair de um sonho, nada parecia real. Nem a dança, nem seu olhar, nem sua voz, nem seu sorriso e muito menos seu jeito parecia real. Eu esperava que ele não me achasse nenhuma idiota pelo constrangimento de não ter visto minha amiga. Mas ele parecia ter pouco se importado com isso. Lembrei de cada detalhe enquanto dirigia o pequeno trajeto até minha casa.
Cheguei em casa, olhei direto no relógio da bina, tinham duas ligações perdidas - as duas da Vi- e eram três horas da manhã. Fui rindo para meu quarto, amanhã eu ligaria para Pâmella. Entrei no banheiro e fui tomar um banho bem quente, relaxei e fui dormir. Tive um sono sem sonhos, acordei com o despertador zunindo em minha cabeceira. Me levantei e me arrumei rápido demais. Ansiosa até. Então eu estava pronta para ver se ele realmente era real como eu pensava que era antes. Corri pela porta a trancando com uma volta só, foi quando eu olhei para o lado de fora realmente, e lá estava ele. Encostado no carro, o uniforme impecavelmente branco. Eu sorri, e ele me retribuiu com um sorriso caloroso, caloroso demais.
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